29/07/2014

AGARRA QUE É LADRÃO!

O Inácio costuma dizer que correr não é natural, que não gosta de o fazer por desporto, que só corre se for para perseguir alguém - ou se for para fugir.

Ontem foi dia de perseguir. E com uma francesinha "no bucho".

Ontem à noite viu-se bem quem é que faz as mini-maratonas, os corta-matos, as corridas - e quem é que corre só por necessidade. O Tiago: lançado Porto afora, a gritar "Rua da Alegria, o gajo está na Rua da Alegria!". O Inácio: uns passos atrás, motivado pela possível recuperação dos seus valores, a adrenalina ao máximo, alguma raiva. E eu: mais alguns passos atrás, já com dores no pé e na perna e no ego, a não querer perdê-los de vista porque além de não fazer ideia onde estava, também não tinha bateria no telefone e não apetecia muito perder-me e complicar uma situação já de si complicada.

Corri, portanto.

Quando eles abrandavam para ganhar fôlego eu mantinha o passo apressado, para recuperar a distância perdida. Se aceleravam, eu tentava acompanhar. Pelo meio o Tiago tentava ligar para o 112 - mas ninguém atendia. E ao chegarmos à Rua da Alegria dividimo-nos, cada um pelo seu lado numa espécie de táctica de guerra inspirada nas batalhas antigas de há quase mil anos.

Chegámos ao lugar onde o "find my phone" dizia que o telefone estava.

Juntámo-nos os três tipo baratas tontas, a olhar à volta, a olhar para o mapa do telefone do Tiago, a correr daqui-para-ali a ver se havia alguém suspeito, alguma coisa largada no jardim. Nada. Um carro parado com um homem lá dentro, sozinho, a janela aberta e a fumar um cigarro - suspeito. Outro homem à porta de um café, a olhar com ar desinteressado - suspeito. Uma pessoa a passar mais em baixo - suspeito. Mas tudo ali era suspeito. O silêncio preenchido pelas batidas dos nossos corações, boom-boom, boom-boom, respira fundo, olha à volta, onde estará o telefone, a carteira, o ladrão.

"Põe o telefone a tocar", lembrou o Inácio.

E assim que o Tiago activou o "alarme", lançámo-nos na direcção de onde vinha o som. O telefone estava ali perto! Ali, na direcção do café Gabero! Ali, aquele gajo encostado à porta! Agarra-o, não o deixes fugir, apanhámo-lo, o cabrão, onde é que está o telefone, onde é que está a carteira, eu não tenho nada a ver com isso, eu não sei do que estão a falar, onde é que está o telefone, seu filho da puta, e o alarme a tocar, junto a nós, junto às nossas mãos, ali mesmo, filho da puta, filho da puta, tira-lhe o telefone do bolso, e de repente estão as nossas mãos nos bolsos dele, os bolsos dele nas nossas mãos...

"Esta carteira! Esta carteira é da Leninha!"

O homem tremia por todo o lado e fingia que não era nada com ele, mas tentava resistir aos nossos avanços e fugir. Estava encurralado entre os nossos insultos e as nossas mãos e a nossa raiva e a porta do café. Lá dentro, o dono do estabelecimento começou aos gritos a dizer para sairmos dali. Pedimos-lhe que chamasse a polícia - ele recusou!

"Está aqui o meu telefone!", grita o Inácio.

"Eu não sei que telefone é esse", defende-se o ladrão, como se por magia tudo aquilo lhe tivesse ido parar aos bolsos. Não me lembro como, acho que vinha um cliente a entrar, qualquer coisa do género - mas conseguimos forçar a nossa entrada no café. O dono do café recusava-se a ligar à polícia, nós aos gritos a explicar que o outro era um ladrão e que tinha as nossas coisas com ele, o outro a tentar fugir, nós a segura-lo, por várias vezes a situação quase descambou para o pugilato - se calhar até tinha sido melhor assim. Mas não foi.

Segurámos no ladrão enquanto este se debatia, ninguém atendia do 112 e o dono do café começou a ameaçar que ia telefonar à polícia, mas a queixar-se de nós. Eu estava, a esta altura, convencido que este senhor também estava envolvido no assalto. A atitude dele foi, no mínimo, nojenta. Para os leitores do blog que sejam do Porto, guardem este nome e risquem-no das vossas voltas: Café Gabero. Por muito que suplicássemos por ajuda, por muito que explicássemos o sucedido, por mais que tentássemos chamar o senhor à razão: não só recusou ajuda, como nos atacou verbalmente e ameaçou.

No meio desta confusão, o 112 atendeu. O Tiago passou-me o telefone e tentei explicar o que se estava a passar. Perguntaram-me a morada e disse "Rua da Alegria", perguntaram-me o número da porta e eu dei o número da porta e o nome do café.

"E a Freguesia, qual é a Freguesia?"

"Eu sei lá a Freguesia, senhor, isto é na Rua da Alegria, número não-sei-que, é o Café Gabero mesmo ao pé do jardim!"

O Tiago e o Inácio aos gritos com o outro a debater-se, onde é que estão as outras coisas, onde é que estão as outras coisas, o dono do cafe aos gritos a mandar-nos sair, eu não tenho nada a ver com isto, o 112 a insistir com a freguesia:

"Tiago, qual é a freguesia?"

"Eu sei lá da freguesia, carago, a polícia que se despache!"

E do outro lado uma voz calma pediu-me para aguardar porque iam enviar alguém. E desligaram. Entretanto o Inácio saiu lançado, atrás de outro homem que tinha saído do café no meio da confusão e que, como o ladrão, era marroquino. Suspeito.

Suspeito: não o facto de ser marroquino. Mas se o ladrão era marroquino, a presença de outro cheirava a esturro.

Como estava a dizer, o Inácio foi atrás do outro. Eu e o Tiago continuávamos a debater-nos com o ladrão, que no meio destas entradas e saídas tinha conseguido vir para a porta do café Gabero. O dono trancou-se lá dentro e continuou a recusar-se a ajudar, por muito que suplicássemos, por muito que explicássemos que a polícia vinha a caminho e que precisávamos que nos ajudasse para o ladrão não fugir. Atacou-nos o tempo todo, como se tivéssemos sido nós a causar a situação, como se os maus da fita fôssemos nós. Como se tivesse algo a esconder. Quem sabe: a carteira da Leninha com as coisas que faltavam.

E eis que no meio daquela confusão, nós ainda a segurar no marroquino quando de repente este vai com a mão ao bolso.

"Cuidado, Jorge!", gritou o Tiago enquanto saltava para trás, "o gajo tem qualquer coisa no bolso!"

Já continuo...

3 comentários:

kyta disse...

Mas que aventura... Faltava aí eu....

LV disse...

AI QUE NERVOS, CONTA O RESTO ................. RÁPIDO !!!!

Anónimo disse...

Uma aventura... no Puoorto!
Andrea