16/09/2014

PRIMEIROS PASSOS NO CAIRO

A primeira memória que hei-de guardar do Cairo - só o tempo o dirá, mas foi muito forte e acho que vai ficar bem registada - é a cidade vista do avião, ainda. Vinha distraído com qualquer coisa, agora irrelevante, quando o meu amigo Manel me chamou a atenção, olha ali, e eu olhei, e do lado de fora da janela a cidade esticava-se até ao horizonte, plana e castanha, carregada de um céu triste, impressionante na sua dimensão.

Aterrámos no vasto e arenoso aeroporto, saímos do avião e tratámos das formalidades do costume, levantámos as mochilas - tudo sem qualquer problema, muito fluído. Além de nós, não vi no aeroporto mais de uma dúzia de outros ocidentais. Que estranho, tendo em conta o que já foi este país, em termos de turismo.

O taxi largou-nos no centro e demos uma voltinha a pé, com as mochilas às costas, quais Leonardos diCaprio no "The Beach", meio-fascinados-meio-perdidos, à procura de um hotel. Não tínhamos marcado nada, mas trazíamos algumas referências. E fomos parar à Pensione Roma, um clássico de outros tempos que ainda está muito bem tratado. Na recepção uma velhota impecável, a falar um inglês clássico, tudo nos parecia tirado de uma história da Agatha Christie mas sem a parte dos crimes e dos mistérios.

De misterioso, só o elevador. Que sensação estranha, quando entrei no prédio e deparei com um poço de elevador igualzinho a outro em que tinha sonhado, não sei se há meses ou anos. Não me lembro quando. Mas lembro-me bem do sonho, um elevador que subia-subia-subia, que saía do prédioe  continuava a subir pelos ares, eu via uma cidade lá em baixo e não sabia o que segurava o elevador, se por cima ou por baixo, se cabos ou uma grua, e tinha imenso medo porque abanava muito... enfim, um sonho. Mas quando vi o mesmo elevador à minha frente!

Curiosamente não me deu tremeliques nem ansiedades. Podia ter dado, não é muito o meu género - mas podia ter dado para isso. Entrámos no elevador e desde o início que foi uma viagem agradável. Parecíamos transportados para um filme antigo, para outros tempos. No elevador vinha um senhor tão clássico quanto o prédio. Não deixou entrar um rapaz que trazia uma bandeja com comida, porque "depois fica o elevador a cheirar a cebola". E subimos os três até ao quarto andar. Abriram-se as portas. Um corredor comprido e alto, o pé direito destes andares tem pelo menos quatro metros, e ao fundo a recepção, a senhora antiga de vestido as florzinhas, o livro de hóspedes enorme e cheio de histórias.

Ficámos, pois claro.

Da janela vejo telhados carregados de lixo e antenas parabólicas. Trazidos por quem, ou pelo quê? Pessoas ou tempestades? Ou apenas o tempo?

O céu está carregado de poluição, buzinas e música, ambulâncias e o namaz cantado a pulmões cheios. Que calor. Não dormi quase nada na noite anterior, porque tivemos de sair para o aeroporto às quatro da manhã. E na noite antes da última, ainda em Ankara, pouco mais dormi. Sento-me na cama, a ler o Lonely Planet, a ver o que fazer, ainda não pesquisei nada sobre o Egipto, não preparámos esta viagem. Não temos pressa, nem eu nem o Manel, estamos ambos cansados.

Adormeço.

Quando acordar, duas ou três horas depois, vou estar com fome e vou querer sair, comer qualquer coisa, dar uma volta. Mas sobre isso já conversamos :)

1 comentário:

Clara Amorim disse...

Pelo andar das crónicas, parece que também vamos viajar pelo Egipto! E que bem que andas a escrever...!