30/09/2015

SÃO REFUGIADOS (parte 6)

Ao fim de alguns dias de férias, consegui finalmente sair da "praia" e lá fui com a Bahar até à parte de cima da cidade, também conhecida por Behramkale e que é uma espécie de Óbidos com vista para o mar. No centro de uma vila antiga toda recuperada, bastante pacata mas com lojas de souvenirs e restaurantes um bocadinho por todo o lado, estão espalhadas as ruínas de uma fortaleza e um templo greco-romano a Atena, deusa da justiça, da inspiração, das artes e de mais uma mão-cheia de coisas.

Aqui viveu Aristóteles, por exemplo. Fundou uma academia, casou com Pythias, a filha do rei Hermias, e só quando a cidade foi capturada pelos Persas é que fugiu para a Macedónia, onde mais tarde haveria de ser o tutor daquele que a História haveria de conhecer por Alexandre, o Grande.

Mas biografias à parte, esta terrinha tem muito que se lhe diga. Bem arranjada, toda pacata, gente simpática, tem uma energia muito positiva. É pena que seja, actualmente, um dos palcos desta tragédia humana que aflige o Médio Oriente e a Europa.

Enfim. Nada que não tenhamos mencionado já aqui.

Mas serve este post para relatar mais um evento testemunhado. Desta vez mais ao longe, do topo do monte onde fica o Templo de Atena. Com uma vista panorâmica excepcional sobre o Mar Egeu e o Mar de Marmara - e as montanhas da ilha de Lesbos à frente.

Depressa reparei em quatro botes que se dirigiam para a Grécia, claro. Cada um a diferentes distâncias. Não consegui reparar no que aconteceu ao que ia mais avançado, pois a certa altura era só um pontinho no horizonte, mas os outros três não tiveram grande sorte.

O mais próximo da costa foi rapidamente "apanhado" pela lancha da polícia, que o rodeou durante bastante tempo, até que se lançou ao encalço do segundo barco. Fiquei convencido que mais cedo ou mais tarde também este primeiro acabaria por avançar... mas a verdade é que ficou ali parado imenso tempo. Não avançava nem recuava. A dada altura deu-me a sensação de alguma coisa ter sido atirada ao mar - e pouco depois constatei que havia uma pessoa a nadar para terra. Provavelmente o traficante, que deve ter apanhado um valente susto com a lancha. Enquanto o via a nadar, o bote ficou no mesmo sítio. Estariam a discutir sobre o que fazer? Teria a polícia esvaziado o tanque de gasóleo? Não consegui perceber - e até me ter ido embora, o bote não saiu do mesmo sítio.

Quanto ao segundo, obviamente acabou por ser apanhado pela lancha. Á distância a que me contrava não consegui descortinar o sucedido, mas dali já não saíram. A lancha ficou com este bote o resto do tempo, pelo menos até me ir embora.

Já o terceiro bote, que ia bem mais avançado, acabou por encontrar destino pior: um barco da Marinha. Lá de baixo, da praia, ainda não tinha reparado nestes barcos maiores. Estão mais ao largo, e só agora que mudei de perspectiva é que dei por eles. Vi-o aproximar-se do bote e apercebi-me de movimentações várias que, embora não sendo muito claras, também não foram difíceis de entender. Os refugiados foram todos transferidos do bote para o barco maior, e depois não sei o que fizeram ao bote mas deixei de o ver. Terá sido furado, como me disse o senhor do restaurante? Terá sido trazido para dentro do barco? Não faço ideia, deixei de o ver assim que o barco começou a dirigir-se para a costa turca, já preparado para apanhar o outro bote que estava, ainda, sob a alçada da lancha da polícia.

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