14/01/2016

UM DIA NO THRISSURPOORAM, UM FESTIVAL ALUCINANTE

Continuando a selecção dos quinze dias que mais marcaram o meu 2015: avancemos então ao longo do mês de Abril, depois da quinzena passada no Myanmar, e de um fim-de-semana em Kuala Lumpur... quando finalmente fui para a Índia.

Cheguei a Hyderabad na primeira semana do mês e comecei por revisitar alguns amigos, ao mesmo tempo que procurava uma mota para ir viajar com o Luís Simões, o talentoso maestro do projecto World Sketching Tour. Só ao fim de duas semanas é que finalmente comprei uma vespa, já bem mais a sul, no Kerala - e se as "peripécias" à volta de todo este processo merecem ser destacadas, nem que seja pelo significado que têm na aventura que se seguiu - ao mesmo tempo tenho que ser fiel àquilo que me propus fazer: uma selecção de apenas quinze dias. Nem mais, nem menos.

Assim sendo, há que fazer opções. Alguns dias terão de ficar "na sombra" de outros. E aquele em que comprei a mota, por muito importante que seja, terá de ficar para outros relatos. Pois neste arranque da viagem que fiz de vespa, há outro momento muito especial: o dia em que eu e o Luís assistimos ao Thrissurpooram, um festival alucinante do sul da Índia.

15 DIAS DO ANO 15

(05) VINTE E NOVE DE ABRIL

Foi sem dúvida um dos mais memoráveis de 2015, este dia em Thrissur. Logo de manhã assistimos à chegada de mais de cem elefantes ao templo principal, sempre em grupos de dez a quinze, mais a demorada, colorida e barulhenta procissão que os acompanhava. Vibrámos com os ritmos e com a dinâmica do evento, apertados na multidão, a suar o verão indiano, a rir e a saborear cada momento.




Depois de almoço enfiámo-nos (vá-se lá perceber porquê) numa confusão de sardinha em lata, os corpos esmagados entre uns-e-outros, um cocktail de suores e óleo de côco, gritos de deixa-passar, sorrisos de what-to-do, mãos atrevidas aqui-e-ali, e tudo aos saltos com a música, e empurra e puxa, mete o cotovelo, respira fundo e tira-o-pé-do-chão! Que caos. Tudo para ver uma orquestra de trezentas pessoas, teoricamente a maior do mundo, mas num espaço mínimo, nem deu para ver. Mas deu para ouvir. Aquele som antigo e hipnótico, percursão e sopro, há qualquer coisa de tribal aqui, de primitivo e mágico, frenético e vertiginoso.

Where are you from?, até no meio desta tempestade humana há quem tenha tempo e paciência para perguntar isto.

Cristiano Ronaldo!, é a reacção. Típico. Será que o famoso madeirense imagina que alguma vez alguém se lembrou de dizer o nome dele numa situação destas?

E depois da tempestade: a bonança?

Nem por isso. Estivémos a descansar à sombra do templo, mas o suficiente apenas para retemperar energias. Estávamos esgotados. Mas quando chegámos ao lugar onde ia decorrer o evento principal, depressa percebemos que ia ser igual ou "pior" que tudo aquilo que experimentáramos antes. E acabámos pro aproveitar a simpática oferta do Turismo do Kerala, que tinha montado uma bancada especial para turistas, com vista privilegiada sobre os rituais e a multidão. Nada mau.







Durante três horas testemunhámos um espectáculo único e milenar, cheio de significados que desconhecíamos, só mais tarde decifrei alguns. A troca de chapéus-de-sol em cima dos elefantes, num sensacional (e simbólico) duelo entre as duas equipas, mais o "oceano de gente" entre ambos. Foi uma experiência única, quem diria, não fazia ideia da dimensão do Thrissurpooram, eu vinha ver um festival com elefantes, sabia pouco mais que isso - mas isto é muito mais que um festival, é uma celebração grandiosa e caótica, como só na Índia, que tem tanto de festival de rock como de procissão religiosa. É a Índia com ponto de exclamação, é a tradição de mais de dois mil anos, as cores e a música e o pó, e milhares de telefones em riste a tirar fotografias e selfies.

Depois de jantar e de fazermos uma sesta, voltámos novamente ao centro da cidade. A festa continuava, estava agora espalhada pelas ruas, os elefantes em pequenos grupos, avançando lentamente pela multidão, sempre acompanhados das orquestras milenares, aquele som hipnótico, pessoas a dançar em transe, lamparinas de azeite a iluminar os rostos cansados.


No final houve fogo-de-artifício, mas ao contrário do que estamos habituados, mais do que uma harmoniosa sequência de cores e efeitos, aqui o que realmente interessava era fazer barulho. Dava a sensação de estarmos a ser bombardeados, tal o caos de explosões e ondas de choque.

Voltámos para o hotel às tantas da manhã. E apesar de nem termos bebido nada, na manhã seguinte acordámos com uma ressaca brutal, o corpo todo a queixar-se, pouca ou nenhuma vontade de arrancar e seguir viagem.

Mas arrancámos.

E seguimos viagem. Primeiro por florestas e cascatas, serpenteando montanha acima até estarmos rodeados de plantações de chá. Depois descemos pelo Tamil Nadu até chegarmos à costa oriental da Índia... e então subimos para o Andhra Pradesh, Orissa e West Bengal. Que viagem! Cada dia, uma aventura diferente.

E este do Thrissurpooram foi, entre todos, sem dúvida um dos mais memoráveis.

1 comentário:

Clara Amorim disse...

Jorge, com o Luís Simões só podia ser mais memorável de 2015!
Adoro-vos! 😊😊😊